quarta-feira, 21 de maio de 2014

Filtros Mentais (Aula 9) 2014




Filtros Mentais
O que os líderes( e pessoas em geral) se permitem saber
O pior cego é aquele que não quer ver, diz o ditado. Segundo o especialista Warren Bennis, há uma razão por trás dessa cegueira: filtros que controlam quais dados aterrissam na agenda ativa de nossa consciência e quais são despachados para os recantos escuros da mente. Artigo Harvard
C orno Júlio César pôde ter ignorado os avisos sobre sua queda iminente, mesmo quando estes caíam como chuva sobre ele? Por que Eckhard Pfeiffer, presidente da Compaq, não escutou os executivos seniores que chamavam sua atenção para novas fabricantes de computadores que estavam drenam do os clientes da Compaq?
O especialista em liderança Warren Bennis sugere um caminho para compreender as curiosas ações ou muitas vezes a paralisia— desses líderes diante da turbulência. Para ele, deve-se primeiramente analisar a forma como eles lidaram com as informações a sua disposição ou, em outras palavras, “o que se permitiram saber e quando se permitiram sabê-lo”.
Bennis, que é professor da University of Southern California e também desempenha funções de consultoria na Harvard Business School e na Kennedy School of Government de Harvard, vem influenciando diretamente o que se pensa sobre liderança há cinco décadas. Suas idéias ajudam a entender o processo decisório, e “como” e “por que” nossas mentes aceitam ou rejeitam certas informações, em especial aquelas que vão no sentido contrário aos fatos anteriores.
As barreiras
Todas as pessoas utilizam filtros, afirma Bennis. Esses filtros, explica o professor, direcionam o fluxo de informações em nossas mentes. Também são esses filtros os responsáveis por controlar quais dados devem aterrissar na agenda ativa de nossa consciência e quais serão despachados para os recantos escuros da mente.

 “Por várias razões, a mente não lhe dá licença para interpretar certos dados”, afirma. “Você não lida com os assuntos que não quer acreditar que sejam reais, e isso o deixa com uma visão distorcida”, acrescenta.
Será que isso poderia explicar, pergunta Bennis, por que a Casa Branca foi em frente com sua decisão de invadir o Iraque quando uma análise retrospectiva sugere que as autoridades deveriam ter visto que alguns dados usados como justificativa para a guerra não eram sólidos? Será que a crença apaixonada do presidente dos EUA de que o plano da Casa Branca era a coisa certa para o país permitiu que informações que corroboravam seus preconceitos suplantassem da dos que iam contra eles?
Primeiro filtro: o Filtro Social.
O processo de tomada de decisão de George W. Bush ilustra um dos três filtros que Bennis identificou como controladores do fluxo de da dos no cérebro: o filtro social.
Este filtro permite aos líderes rejeitar certos dados simplesmente ao não prestar atenção a sua fonte “Quando estive em Abu Dhabi alguns anos atrás, um colega de lá me falou de uma expressão do Oriente Médio utilizada para descrever pessoas que param de escutar”, conta Bennis. “Era algo como ouvidos cansados”, lembra.
Pense em Pfeiffer, que administrou quase sete anos de crescimento ininterrupto da Compaq antes que as coisas sofressem uma forte reviravolta para pior. “Ele tinha uma lista A e uma lista B”, diz Bennis. “E a lista A  dele dizia ‘Sim, senhor’, ‘Sim, sim, senhor’ a qualquer estratégia que propusesse.” “Mas a lista B dizia: ‘Olhe, chefe, o sr. sabe que talvez a gente devesse dar uma olhada no que a Gateway anda fazendo ou no que a Dell está fazendo, porque eles estão roubando uma porção de clientes nossos’. Pfeiffer não escutava ou não analisava as evidências. No final das contas, ele parou de se reunir com as pessoas da lista B, que lhe davam notícias ruins e desestabilizadoras. Ele estava com ouvidos cansados”, relata o especialista.
Então, Pfeiffer deliberadamente se colocou em uma posição na qual certas informações não poderiam chegar até ele porque queria evitar lidar com o que sabia que era  verdade? Não necessariamente, diz Bennis. E possível que ele simplesmente tenha começado a ignorar quaisquer dados que não afirmassem aquilo que ele acreditava, em certo nível, ser verdade.
É importante distinguir esse tipo de cegueira às informações do conceito jurídico de cegueira intencional, na qual um indivíduo propositadamente se fecha aos dados a fim de criar ignorância propositada de certos fatos —por exemplo, aquilo que Kenneth Lay, ex-presidente da Enron, pode ter feito. As forças em ação aqui freqüentemente são de uma natureza bem menos consciente.
Vejamos o caso do César de Shakespeare. A evidência de perigo é gritante. “Sua esposa sonha com ele como uma estátua sangrando com cem bicos jorrando e romanos luxuriantes lavando suas mãos no sangue. Uma coruja piou, o que significava muito na Roma de 44 a.C. Um leão correu pelas ruas”, lembra Bennis.
Mas César sempre ignorava os sinais. Ele não aceitou nem a mensagem avisando-o sobre o perigo representado por Cassius, Casca e Brutus. “Por que ele não deu atenção a tudo isso?”, pergunta Bennis. Pode-se fazer a mesma pergunta sobre Pfeiffer, Raines e incontáveis outros líderes que enfrentaram grandes fracassos. “A tragédia é a forma pela qual perdemos pessoas boas porque elas não conseguem escutar ou não querem escutar”, afirma o especialista.
Segundo filtro: Filtro Contextual
Se os filtros sociais nos permitem isolar determinadas fontes de informações, filtros contextuais nos permitem rejeitar o significado daquilo que nos rodeia.
Para explicar isso, Bennis recorre a suas próprias experiências como reitor da University of Cincinnati, de 1971 a 1978. “Eu fui trazido para balançar o coreto e transformar aquela escola custeada pelo município em uma importante universidade”, afirma ele. “Lá estava eu, uma espécie de estrangeiro, e as pessoas de Cincinnati pensando que eu lhes estava roubando a universidade”, lembra. Então Fred Lazurus Jr., fundador da Federated Department Stores, com seus mais de 80 anos, ofereceu o que Bennis descreve como um sábio conselho. “Ele disse: ‘Warren, esta é uma cidade realmente conservadora. Não se exponha demais. Trabalhe com seu corpo docente, trabalhe com seus alunos. Não se deixe tragar pelos holofotes”, conta o especialista.
Mas Bennis não tentou entender a cultura com que estava lidando, o que tornou seu papel de agente da mudança ainda mais difícil. “Eis aqui a lição sobre contexto”, afirma Bennis. “Eu não usei tempo suficientes para entender a cidade, seu orgulho, sua história. Não gastei tempo para lhe fazer as honras”, explica.
Vejamos outro caso de líder com a responsabilidade de mudar: Carly L. Fiorina, da Hewlett-Packard. “Par começar, houve três greves contra ela”, diz Bennis. “Ela é mulher, não é engenheira e a primeira pessoa de fora da Hewlett-Packard a chegar à presidência da empresa. Como é que ela navega entre o passado e o presente?”, acrescenta.
O que Fiorina fez foi usar cuidadosamente os símbolos da rica tradição da HP para detalhar sua visão do futuro. Por exemplo: inicialmente ela utilizou a imagem de Dave Packard e Bili Hewlett como os garotos na garagem para criar entusiasmo quanto à forma pela qual a HP continuaria a gerar idéias inovadoras. A consciência da situação que Fiorina demonstrou permitiu-lhe remover os filtros contextuais que a poderiam ter levado a uma abordagem diferente, menos eficaz para comunicar sua visão para a HP.

Terceiro filtro: Autoconhecimento
O terceiro e último filtro que Bennis identifica é regido pelo autoconhecimento: o que você conhece e não conhece sobre si mesmo. Novamente, Bennis recorre a sua própria experiência. “Por várias razões, algumas relacionadas à ambição, outras a querer ver se minhas idéias realmente tinham validade na prática, eu tinha o desejo de ser um reitor de universidade”, relata.
Depois de sete anos à frente da University of Cincinnati, Bennis fez um discurso na Harvard Graduate School of Education sobre o papel de liderança de um reitor. “Eu preparei muito bem a palestra e achei que tudo saiu bem”, lembra. “E aí abri para perguntas.”
Do fundo da sala, Paul Ylvisacker, então diretor da escola, fez uma pergunta que Bennis descreve como “um arremesso de efeito”:
“Warren, você ama ser reitor?”. Ele ficou totalmente sem palavras e conseguiu apenas dizer: “Não sei”.
Mais tarde, no avião de volta para Cincinnati, Bennis percebeu o que o diretor havia conseguido captar: que seu coração não estava em ser reitor; ele simplesmente não tinha a gana para isso. Ele percebeu posteriormente, segundo conta, que ser um reitor de universidade “não era minha vocação”. Dessa maneira, viu-se forçado a enfrentar sua falta de autoconhecimento. Os líderes carecem de autoconhecimento, explica Bennis, sua capacidade decisória fica comprometida importa quais informações estejam a sua disposição; se você próprio não souber o que o impulsiona a fazer o que faz, a probabilidade de interpretar e utilizar mal esses dados aumenta significativamente. “A falta de autoconhecimento é a fonte cotidiana mais comum dos fracassos de liderança”, garante Bennis.
“Muitos indivíduos capacitados que conheci ao longo dos anos e que se viram dirigindo organizações aspiravam a essa alta posição sem saber o que isso envolvia e o que o futuro lhes reservava. Eles queriam ser presidentes, mas não fazer o trabalho de um presidente. Essa é a primeira pergunta que faço a todos os líderes de alto potencial. Você sabe o que o espera, e você sabe se o papel se adapta a seu conjunto de habilidades e ao que você tem de melhor? E exatamente isso que eu não me perguntei”, explica o especialista.
O espectro completo
A formação de uma base maior de conhecimento sobre as próprias circunstâncias é o elemento crucial para a eliminação dos três filtros que Bennis identificou.  De acordo com o especialista, os líderes inteligentes sabem que muito provavelmente seu poder os isolará. Então, eles adotam atitudes para se resguardar desse isolamento, tanto antes como depois de tomar decisões.
Quando Clark Clifford assumiu o Departamento de Defesa dos EUA, sucedendo Robert McNamara, durante a guerra do Vietnã, “ele começou a conversar com pessoas de todos os níveis da organização, não só com seus subordinados diretos, para não receber apenas as notícias de sempre”, conta Bennis. “Robert Carter, diretor-financeiro do FedEx, freqüente mente realiza reuniões gerais com seu pessoal e encoraja a franqueza ao almoçar todo mês com oito funcionários”, acrescenta.
Bennis sugere que os líderes levem essa estratégia um passo adiante, adotando um processo de discussão posterior à tomada inicial de decisão. Assim, a liderança terá a oportunidade de repassar o raciocínio por trás de uma decisão antes de implantar um plano de ação.
Por exemplo: depois que os membros do conselho de administração da GE concluíram que a melhor opção seria designar Jeff Immelt como sucessor de Jack Welch, o conselho levou três semanas estudando a recomendação, a fim de permitir que a decisão amadurecesse antes de fazer a votação final e o comunicado oficial.
Os líderes devem sempre estar certos de que possuem o espectro completo de dados e opiniões, recomenda Bennis. “Acho que os melhores líderes fazem como Henrique V agia”, observa ele. Na véspera da batalha, “ele tirava suas vestes reais, vestia o uniforme de campanha de um soldado raso, saía e se misturava à tropa, perguntando-lhes o que estava acontecendo”.

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